A produção do audiovisual brasileiro “Cangaço Novo”, lançada em agosto deste ano no Amazon Prime Video, já é uma das 10 séries mais assistidas em 49 países, incluindo o Brasil. A produtora da trama é Andrea Barata Ribeiro, sócia-fundadora da O2 Filmes, que tem no currículo sucessos do cinema – “Cidade de Deus”, “Cidade dos Homens” e “Ensaio sobre a Cegueira” -, e também nas plataformas de streamings – “Irmandade” (Netflix) e “Manhãs de Setembro” (Amazon Studios) -, e de TV – série “Segunda Chamada” (Rede Globo).
Andrea, o diretor, os criadores e os roteiristas do “Cangaço Novo” estiveram nesta terça-feira (7/11), em Belo Horizonte, para participar da programação da MAX 2023, maior evento do audiovisual no estado, promovido pelo Sebrae Minas.
Em entrevista exclusiva para a Agência de Notícias do Sebrae de Minas Gerais, a produtora, que foi eleita pela revista americana Variety Magazine como uma das cinco mulheres mais influentes do entretenimento, falou sobre o mercado de audiovisual no Brasil e os desafios para a produção da série que tem despertado a atenção do público mundo afora.
ASN/MG – Como foi o processo de produção do “Cangaço Novo” e quais foram as maiores dificuldades enfrentadas?
Andrea Barata – O projeto chegou em minhas mãos há cerca de 7 anos. Desde a entrada da Amazon no mercado de streaming no Brasil, tenho apresentado o projeto, até que finalmente resolveram apostar na história fora dos limites São Paulo/Rio. A trama, criada por Mariana Bardan e Eduardo Melo, é baseada em assaltos a bancos em pequenas cidades nordestinas comandadas por quadrilhas fortemente armadas, entre as décadas de 1990 e 2000, que ficaram conhecidas como o ‘novo cangaço’. Inclusive, durante as filmagens tínhamos um cenário real de uma agência bancária que foi atacada com explosivos. Para se ter uma ideia, têm bancos cavando um buraco enorme como sistema de segurança, pois em caso de explosões, o cofre cairia nessas crateras, dificultando o roubo.
A trama é repleta de ação, mas também apresenta uma relação familiar intensa e cria uma história com a identidade regional. E esse era nosso grande desafio, produzir um roteiro com um olhar do povo nordestino. Para que isso fosse possível, fizemos uma imersão com o diretor e roteiristas na região, além de realizarmos uma grande pesquisa com a população local. Outra estratégia que adotamos para dar mais veracidade a história, foi a participação de atores nordestinos e, em sua grande maioria, desconhecidos, mas geniais. A própria Alice Carvalho, a “Dinorá”, foi uma dessas revelações.
Além disso, com a pandemia, demoramos muito para fazer as filmagens e desenvolver os roteiros.
Como as questões de diversidade e inclusão estão sendo abordadas no setor de audiovisual?
Se compararmos há 10 anos atrás, o setor mudou completamente. Por exemplo, antes, não víamos muito atores e atrizes negros como personagens principais. Eles sempre atuavam como empregadas, motoristas, bandidos, dançarinas, jogadores de futebol ou cantores de funk. Nem as relações homoafetivas eram abordadas. Hoje, notamos uma preocupação maior com a inclusão, mas ainda temos muito para evoluir.
Não é à toa, que muitos players do setor estão exigindo que os projetos tenham um elenco e uma equipe técnica com gente de todo o tipo de raça, crença, gênero, credo e opção sexual para que o público se sinta representado e para que possamos ter vários olhares sobre uma mesma perspectiva.
Quais são os principais desafios enfrentados pelo cinema brasileiro para competir com as produções de outros países?
Temos países com histórico de investimentos mais longos e representativos no audiovisual que o Brasil. O setor passa por crises constantes por falta de incentivos e financiamentos. Antigamente, nem tínhamos como dar as caras para o mundo, já os grandes festivais eram realizados fora do país, como o de Cannes, na Alemanha. Para se ter uma ideia, minha produtora teve cinco indicações ao Oscar, mas isso não tem tanto peso se não tivermos uma legislação que estimule o setor.
Outra dificuldade que temos é em relação ao idioma. O Brasil é o único país na América Latina que fala português. Além disso, é nítido o domínio do mercado audiovisual americano. Porém, notamos a representatividade do cinema argentino, polonês, alemão e francês, que estão há mais tempo investindo no segmento que o Brasil.
Qual é o papel das plataformas de streaming no mercado de entretenimento?
As plataformas vieram como um complemento do mercado. Cresceu e abriu novas portas para o audiovisual. Os streamings vêm com uma grande força com investimentos financeiros, mas também chegam com algumas restrições. Apesar do bom relacionamento, o produtor ainda precisa ter mais independência. Muitos não conseguem ter a propriedade intelectual da própria história. Por exemplo, se eu apresento um projeto e ele é aprovado, a plataforma fica com a propriedade da série ou filme. Se houver uma segunda temporada, não necessariamente vão fazer comigo.
Além disso, o Brasil ainda está na briga pela regulamentação do VOD. A França, a Itália e outros países que já têm essa regulamentação e as plataformas são obrigadas a fazer certa quantidade de produções independentes. Se considerarmos que somos um dos cinco maiores mercados do mundo do audiovisual, ainda estamos engatinhando neste sentido.
Quais são os modelos de negócios emergentes no setor de audiovisual e como eles estão evoluindo para atender às mudanças nas preferências das novas gerações?
É preciso estar acompanhando os novos modelos de negócio, as mudanças de comportamento do mercado e os hábitos das novas gerações. Por isso, na O2 filmes, temos unido a nossa experiência com novas ideias de jovens, formando um verdadeiro caldeirão de criatividade. Até porque, o mercado não tem mão de obra qualificada o suficiente para dar conta do volume de produções que temos e eventualmente vamos ter.
Essas mudanças impactam também a publicidade. Antes, os comerciais eram de 1 minuto e uma vinheta até 5 minutos. Agora o desafio é fazer um filme na vertical e na horizontal, de 5, 8 e 15 segundos, e que se adaptem em todas as telas.
Também temos que pensar em formas alternativas de remuneração, não ficando apenas nas janelas convencionais, como o cinema, video on demand, TV a cabo e aberta. Hoje, as pessoas estão o tempo inteiro no celular, que torna interessante o investimento em coproduções em plataformas online e em canais como o Youtube e Tik Tok. Por isso é muito importante estar de olho nas novas tecnologias e nas necessidades e exigências do público.
Quais são as oportunidades e conselhos que daria para os empreendedores que desejam ingressar na indústria do audiovisual?
Trabalho, trabalho e mais trabalho, esse é um dos segredos para quem quer começar no audiovisual. Tem que ter disposição e muita vontade. É puxado! Trabalhamos 12 horas por dia, debaixo de chuva e de sol. Se não amar o que faz, desiste no primeiro mês.
Outra dica é estudar e não desistir. Falo muito para quem está começando para acessar as redes sociais dos produtores/diretores e insistir por uma oportunidade. Cinema é uma das graduações mais procuradas em São Paulo. Quando eu estudei, o pavor de todo mundo era terminar no cinema. Ou você trabalhava na Globo ou com publicidade. As pessoas nem sabiam o que faziam os roteiristas. Hoje, já existe um mercado promissor.
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