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“Produtores que não cumprirem as regras vão encontrar um dificultador para conseguir crédito rural”

Diretor do Banco Central, Cláudio Filgueiras, alerta sobre as exigências do mercado financeiro para a concessão de recursos para negócios do campo que estão em sintonia as práticas de ESG
Por Roger Dias
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O termo ESG – em português, meio ambiente, social e governança – foi criado pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 2000. Nesse encontro, foi firmado um compromisso, que acabou gerando um grande movimento no mercado, especialmente, o financeiro.

Na prática o ESG é um conjunto específico de critérios ambientais, sociais e de governança com métricas específicas a serem atingidas, já que os consumidores estão cada vez mais conscientes da importância da sustentabilidade e cobram das empresas atitudes coerentes e responsáveis.

Além disso, muitos investidores vão priorizar títulos alinhados ao assunto e deixar de investir em produtos e serviços ou empresas com abordagens não coerentes com as diretrizes. Como consequência, haverá um aumento das restrições ao financiamento dos setores, inclusive do agronegócios. Por outro lado, serão geradas mais oportunidades e condições diferenciadas para acesso a capital, juros e financiamentos aos negócios que estiverem em sintonia com a sustentabilidade.

Devido à relevância do assunto, o “Encontro do Educampo Café”, promovido pelo Sebrae Minas, na Semana Internacional do Café (SIC), na última quinta-feira (10/11), em Belo Horizonte, reuniu mais de 200 cafeicultores do Educampo e vários especialistas sobre o assunto para falar sobre a relação do ESG com o mercado financeiro.

Um dos palestrantes do evento foi o chefe do Departamento de Regulação, Supervisão e Controle das Operações do Crédito Rural do Banco Central, Cláudio Filgueiras. Em entrevista exclusiva para a Agência de Notícias do Sebrae de Minas Gerais (ASN-MG), Filgueiras ressaltou o papel do Banco Central no processo de regulamentação financeira para a concessão do crédito rural, e como os produtores rurais que implementam práticas de ESG já sendo favorecidos no acesso a recursos financeiros e investimentos.

ASN-MG – O que exatamente significa “ESG” no contexto do mercado financeiro e como está relacionado à concessão do crédito rural?

Cláudio Filgueiras – Os negócios que envolvem práticas ambientais, sociais e governança, focadas no ESG, já ocupam uma faixa significativa do mercado. São aquelas empresas que controlam o que produzem, e se preocupam com as pessoas que integram toda a cadeia produtiva.

No agronegócio, não é diferente. O produtor rural também está atento ao mercado cada vez mais exigente sobre a importância do ESG, porém, muitos fazem o básico. Isso também se deve, a uma legislação mais rigorosa, em termos ambientais. Assim, o produtor que não cumprir esses critérios, já encontrará um dificultador para conseguir crédito rural, pois seria injusto com aqueles que se esforçam para ter essa postura e seguir as normas. Serão beneficiados, por exemplo, aqueles que trabalham com a agricultura orgânica e agroecologia, utilizam energias renováveis e fertilizantes orgânicos, além do uso racional dos recursos naturais.

Por isso, o Banco Central orienta e repassa esses critérios tanto para as instituições financeiras, que concedem o crédito, como também para o produtor rural. É importante lembrar que não temos o papel de classificar, mas sim de regulamentar e conscientizar.

Quais políticas ou diretrizes o Banco Central implementou ou está considerando implementar para promover práticas de ESG no crédito rural? Há planos para aprimorar ou expandir as políticas já existentes?

Em 1993, começamos a ter um sistema de registro mais moderno. Essa plataforma nos permitiu ver as coordenadas geográficas, por meio de imagens de satélites, que nos ajudaram a ter uma noção do impacto de uma determinada atividade em uma localidade.

Ao longo dos anos também criamos regulamentações para dificultar a concessão de crédito para aqueles que não têm um negócio sustentável, não só economicamente, mas também ambientalmente e socialmente. Isso porque, o produtor rural sente que há regras imprescindíveis que devem ser seguidas para demonstrar que está fazendo algo além.

Quais os avanços mais importantes na legislação brasileira que estimulam o produtor a cumprir regras de meio ambiente e sustentabilidade? 

Temos algo muito importante na nossa legislação que é um código que visa à preservação da propriedade. De uma certa forma, obriga o produtor a fazer o uso adequado da sua terra.

Também já conseguimos modernizar leis e criar outras, como a Cédula do Produtor Rural (CPR) eletrônica, que viabiliza a produção e comercialização por meio da antecipação do crédito rural. Há ainda a Cédula do Produtor Rural Verde (CPR Verde), que incentiva a proteção.

Dessa forma, estamos criando elementos para diferenciar os produtores e implementam práticas de ESG e estão buscando recursos financeiros para evoluir. Inclusive, o Conselho Monetário Nacional também criou leis para explicitar o diferencial que esses produtores têm.

Quais são as oportunidades de financiamento e investimento disponíveis para os produtores rurais que investem em práticas de ESG, hoje no Brasil? Como eles podem acessar essas oportunidades?

As oportunidades de financiamentos direcionáveis estão muito aquém do que o mercado necessita. Hoje, há também o mercado de capitais que concede crédito mais barato e a longo prazo.

Mas infelizmente, esse direcionamento financeiro não é infinito, assim como o recurso do Tesouro Nacional não é, já que o setor agrícola há uma maior demanda por crédito. Por isso, precisamos suprir essa necessidade buscando investimentos privados no mercado.

O Banco Central anunciou no ano passado que o Brasil bateu recorde na emissão de papéis ligados a projetos de sustentabilidade ou a metas ESG. Quais os maiores benefícios para o produtor que segue essa agenda sustentável?

Estamos ainda muito longe da meta. O Banco Central fez esse anúncio, mas não envolve somente o crédito rural. Você tem a parte política, que se desdobra na responsabilidade social, ambiental e climática, além da divulgação de informações quantitativas e qualitativas.

Já começamos a análise qualitativa, e agora iniciaremos a quantitativa. A partir do momento que a legislação foi modernizada, tornando a emissão eletrônica mais fácil, os papéis sustentáveis passaram a ser emitidos para vários setores como: agronegócios, transporte e energia.

Porém, o Brasil tem um potencial maior de emissão desses papéis sustentáveis. Por exemplo, no caso dos agronegócios, esse processo está mais devagar do que em outros setores, infelizmente. Estamos muito atrasados em se tratando da monetização da parte de quem produz pautado na sustentabilidade. Os instrumentos existem, mas precisamos nos unir para conseguir chegar mais à frente.

Quais são as tendências futuras no mercado financeiro ESG e como elas podem impactar o agronegócio e os produtores rurais?

O produtor rural não tem como fugir das práticas de ESG. Muitos consumidores já preferem pagar mais caro por um determinado produto que tenha sido feito de forma responsável e sem impactar o meio ambiente.

Temos hoje, por exemplo, cafés com várias pontuações que classificam sua qualidade. Esse fator, aliado ao manejo sustentável dos produtos, será sempre mais valorizado pelo mercado do que aqueles que são cultivados sem nenhum cuidado com o solo ou até mesmo com os rios e nascentes.

Os bancos são obrigados a ter uma política para concessão de crédito. E onde que isso pega? Exatamente na conduta do produtor em relação à responsabilidade social, ambiental e climática do negócio.

O fato é que alguns produtores conseguem crédito mais facilmente em determinadas instituições do que em outras. Se o produtor rural se encaixar nos critérios daquele banco, ele terá um crédito mais rápido do que o outro que não cumpre nenhum requisito.

Agora, nosso desafio é buscar novas informações para que essa diferenciação possa ser quantificada pelo mercado.

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